"E agora que as mãos da incrédula
rapariga te empurram para a saída,
onde irá chover, de acordo com
a cor do céu, não resistas. Na rua,
onde os ventos se cruzam na esquina,
os que sopram, do norte, de colinas
manchadas pelo inverno, e os que
nascem do rio, trazendo a impressão
húmida do litoral, acende um cigarro,
para que o calor do lume te reconforte
as mãos, avança pelo passeio, enquanto
o frio te deixar, e ouve o canto da água
por baixo de terra: correntes
no limite entre o gelo e o fogo,
uma evaporação de humores,
como se as almas lutassem em busca de
saída, e, no fumo de uma memória
de mesa antiga, tu e essa que amaste,
trocando as frases matinais do reencontro.
Vidros embaciados pelas
lágrimas da ruptura, perguntas sem resposta,
a casa de luzes apagadas, como se estivesse vazia
- e como se não soubesses que os destinos
se decidem por cima de nós,
onde em cada instante um deus cansado
nos desfaz as inúteis promessas de eternidade."
Nuno Júdice, in "A Fonte da Vida"